Dados pessoais
Juliano Moreira nasceu em 6 de janeiro de 1873, na Freguesia da Sé, na cidade de Salvador, então província da Bahia.
Era filho de Galdina Joaquim do Amaral, sua mãe trabalhava como doméstica na casa do médico e Professor Adriano Lima Gordilho, o Barão de Itapuã. Foi criado pela mãe e pelo Barão, catedrático de Obstetrícia da FAMEB, logo o tomou como afilhado e garantiu os seus estudos no Colégio Pedro II e depois no Liceu Provincial.
Reconhecido posteriormente pelo pai, Manoel do Carmo Moreira Junior, português, funcionário municipal, inspetor de iluminação pública.
Casou-se com Augusta Peick, enfermeira alemã que conheceu durante sua estadia em um sanatório na cidade do Cairo, para tratar da tuberculose.
Faleceu, em 2 de maio de 1933, no Sanatório de Correias, distrito da cidade de Petrópolis, Rio de Janeiro.
Trajetória profissional
Juliano Moreira iniciou seus estudos primários no Colégio Pedro II e os concluiu no Liceu Provincial, ambos na cidade de Salvador.
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Com seu início no ano de 1836, o Ensino Secundário baiano contava com o Liceu Provincial na Capital, que em 1895 passou a chamar-se Ginásio da Bahia |
1886
Precoce, Juliano Moreira (JM) ingressou em 1886, extraordinariamente, aos 14 anos de idade, na Faculdade de Medicina da Bahia.
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1886, com apenas 14 anos, Juliano Moreira foi matriculado na Faculdade de Medicina após ser aprovado no preparatório e pagar a quantia de 50 mil réis ========== |
1887
Juliano Moreira estava matriculado no 2° ano do curso médico, com 15 anos. Ainda como acadêmico do 5° ano, em 1890, Juliano foi aprovado em concurso para Interno da Clínica Dermatológica e Sifilográfica.
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1891
Doutorou-se na Faculdade de Medicina da Bahia em 1891, na qual foi professor da cadeira de clínica psiquiátrica e doenças nervosas. Ele se formou em medicina e cirurgia e teve sua tese inaugural “Etiologia da Syphilis Maligna Precoce” aprovada com louvor. Essa obra é não só uma referência no campo da dermatologia, mas também um marco no estudo da questão racial dentro da ciência e um preâmbulo do constante questionamento de Juliano sobre as desigualdades raciais da época. Neste trabalho, ele questiona sobre a conceituação racial do ser humano: “Quantas são as raças? Onde termina a raça branca? Onde começa a amarella? Onde acaba? Onde começa a preta? [...]” , num tempo em que muitos médicos e outros estudiosos consideravam a raça negra inferior e a miscigenação causa de variadas doenças, inclusive da loucura.
Juliano Moreira, embora contasse à época com apenas 18 anos de idade, já era conhecido internacionalmente nos meios acadêmicos, tornando-se referência para os estudos sobre a sífilis.
1894
Torna-se Assistente da cadeira de Clínica Psiquiátrica e de Doenças Nervosas, quando inicia a sua jornada pelas doenças mentais. Em 15 de setembro do mesmo ano, após concurso, é nomeado Preparador de Anatomia médico-cirúrgica da FMB. Neste mesmo ano, no mês de novembro, é um dos responsáveis pela fundação da Sociedade de Medicina e Cirurgia da Bahia.
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1895
Em meados deste ano, ele é o primeiro no país a descrever o botão endêmico ou “botão de Biskra” no Brasil, chamado hoje de leishmaniose cutâneo-mucosa (Leishmaniose Tegumentar Americana). O primeiro trabalho de JM publicado fora do Brasil também é pioneiro na Dermatologia: sua descrição de uma dermatose rara, a Hydroa Vacciniforme, foi publicada pelo British Journal of Dermatology em 1895. Foram dele também os primeiros exames microscópicos feitos entre nós de casos de Micetoma (aspergiloma pulmonar). Além disso, realizou o estudo anatomopatológico mais completo até hoje sobre Ainhum (Doença de Silva Lima), sendo esta monografia publicada em alemão e foi um dos trabalhos feitos por brasileiros mais citados por estrangeiros na época.
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1896
Juliano se candidata a Lente Substituto da 12ª seção, a cadeira de Moléstias Mentais e Nervosas, com a tese Discinesias arsenicaes, e fica em 1º lugar, após a obtenção de 15 notas máximas. As provas contaram com a presença de diversos estudantes sob a liderança dos sextanistas, com destaque para Afrânio Peixoto, que temiam uma decisão tendenciosa devido à banca examinadora ter fama de racista.
Foi então, aos 23 anos, que JM tornou-se professor concursado da Faculdade de Medicina da Bahia. Esta nova atribuição de Juliano o faz viajar muito pela Europa, onde participava de importantes congressos, tanto da área de dermatologia, com a qual ainda mantinha um vínculo, como também os de psiquiatria.
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1900
Representou o Brasil em diversos encontros científicos no exterior, como o XI Congres International de Médecine, Paris/França
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1901
Mesmo ausente, foi eleito Presidente de Honra do IV Congresso Internacional de Assistência aos Alienados em Berlim.
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1902
Participou da Escola Tropicalista da Bahia, tendo efetuado vários trabalhos sobre o Goundum (bouba terciária), a leishmaniose tegumentar, a lepra e mycetoma em casos observados na clínica do médico Antônio Pacheco Mendes, na cidade de Salvador.
Contribuiu por uma década com o conteúdo da Revista Gazeta Médica da Bahia. No início do século XX de julho de 1901 a junho de 1906 ele se tornou o principal redator da Gazeta Médica da Bahia, principal publicação médica da Bahia e uma das mais importantes do Brasil, onde produziu inúmeros textos de resenha, artigos e editoriais .
Em 10 de novembro de 1902 licenciou-se da Faculdade de Medicina da Bahia e viajou para a cidade do Rio de Janeiro, onde assistiu ao ato de embalsamento do cadáver de seu amigo, mestre, e médico Manuel Victorino Pereira (médico, político e vice-presidente do Brasil no governo de Prudente de Moraes). Eram dias coincidentes com os da posse do Presidente Rodrigues Alves, que teria como Ministro da Justiça e Negócios Interiores o Dr. José Joaquim Seabra. Através de Afrânio Peixoto (médico e político), já então no Rio de Janeiro, estabelece-se a ligação entre J. J. Seabra e Juliano Moreira.
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1903
Após ter exercido a clínica psiquiátrica na Bahia, mudou-se para o Rio de Janeiro.
Nesse mesmo ano recebeu o convite do Ministro J. J. Seabra, para dirigir o Hospício Nacional de Alienados, no Rio de Janeiro. Após muitas viagens e contatos feitos na capital federal, Rio de Janeiro, Juliano foi nomeado, em 25 de março, Diretor do Hospital Nacional de Alienados, permanecendo até 1930. A partir daí, sua vida passou a ser mais ativa na capital do país. Uma das suas atitudes que chamaram muito a atenção foi que, pouco depois de assumir o cargo de diretor do Hospital, ele desistiu da sala destinada à direção, no segundo andar, e fez de uma saleta no térreo o seu gabinete, à esquerda da entrada principal do prédio, sempre de portas abertas, onde atendia a todos que o procuravam, sem agendamento ou hora marcada.
Apesar de avesso ao racismo científico, Moreira também aceitava certos aspectos do pensamento eugênico, por exemplo propunha que fosse afastada dos alienados, delinquentes, degenerados e alcoólatras a possibilidade de reprodução, através da prescrição da esterilização destes.
Ele foi responsável por diversas transformações no modelo de atenção psiquiátrica da época no Brasil. Até então, o Brasil fazia uma simples reprodução da atenção psiquiátrica da escola francesa, sem levar em consideração as diferenças culturais. Juliano Moreira iniciou então uma reforma deste modelo, criando um modelo de atenção mais humano e adequado às características culturais do Brasil do início do século XX. Ele retirou as grades das janelas das enfermarias; aboliu os coletes e as camisas de força; criou o Pavilhão Seabra (amplo prédio que abrigava diversos equipamentos trazidos da Europa que auxiliavam no funcionamento de oficinas de ferreiro, bombeiro, mecânica elétrica, carpintaria, marcenaria, tipografia e encadernação, sapataria, colchoaria, vassouraria e pintura), onde os assistidos realizavam atividades que auxiliavam em sua recuperação e lhes traziam alguma renda; passou a implantar a música nos corredores do hospital como terapêutica; tornou o hospital um centro cultural, trazendo professores, cientistas e trabalhadores e implantou oficinas artísticas antecipando-se à, posteriormente criada, terapia ocupacional.
Albert Einstein, em visita ao Brasil em 1925, quebrou o protocolo e aceitou o convite de JM, que o recebeu em discurso na Academia Brasileira de Ciências, para ir ao Hospital Nacional, e ficou encantado com essas oficinas terapêuticas para os alienados.
O Hospício torna-se o grande centro de assistência, pesquisa e formação de psiquiatras, de indelével marca na história da medicina brasileira.
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1904
nova fase do Hospital Nacional de Alienados, no Rio de Janeiro
1905
Em 1905, ao lado de Afrânio Peixoto e outros colegas, ele fundou os Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Ciências Afins. Com a proposta segundo seus editores, de "registrar as contribuições nacionais" e "estimular os especialistas nacionais ao estudo acurado de seus doentes"
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1906
De 1906 a 1922 e foi Presidente de Honra da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina.
Instalou a seção de laboratório no hospital, dando início às primeiras punções lombares e aos primeiros exames citológicos de líquido céfalo-raquidiano como diagnóstico neurológico em casos de tabes dorsalis, demência paralítica, sífilis cerebral e meningites várias
19-26/04/1906 - Lisboa/Portugal, participou do XV Congrès International de Médicine, Juliano Moreira conheceu os médicos Miguel Augusto Bombardia (⛧1851-✞1910), organizador deste Congresso e diretor do Manicómio de Rilhafoles (Lisboa), Júlio Xavier de Matos (⛧1856-✞1922), criador do ensino oficial da psiquiatria em Portugal, e Júlio Dantas (⛧1876-✞1962), médico militar e escritor
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1910
Além de viagens de estudos, já era obrigado a procurar com frequência especialistas e clínicas para consultas sobre sua própria doença. Juliano Moreira sofria de tuberculose. Acentuando-se as crises, obteve uma nova licença e viajou à Europa em busca de melhor tratamento e posteriormente internou-se num sanatório na cidade do Cairo, onde conheceu Augusta Peick, enfermeira alemã, de Hamburgo. Os dois se casaram no início da década de 1910 e vieram juntos para o Brasil.
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Juliano Moreira e esposa Augusta Peick Moreira em um passeio na cidade do Cairo, Egito Fonte: Memorial Juliano Moreira |
A Revista Psychiatrische, Neurologische Wochenschrift (nº. 27), de 03 de outubro de 1910, publicou a galeria dos proeminentes psiquiatras em todo o mundo. Somente Juliano Moreira representou as Américas .
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1911
Juliano Moreira foi nomeado, em 1911, diretor da Assistência Médico-Legal de Alienados, órgão que havia sido criado em 1890 e que posteriormente, em 1927, tornou-se o Serviço de Assistência a Psychopatas. Exerceu esta função sem remuneração adicional, acumulando-a com a de diretor do Hospital Nacional de Alienados.
Como diretor do Diretor do Hospital Nacional de Alienados em 1911, recebeu no hospital líder da Revolta da Chibata, João Cândido, para tratamento de uma "psicose de exaustão". Em 18 de abril de 1911, o "Almirante Negro", que cumpria pena na Ilha das Cobras, foi transferido para o Hospital dos Alienados, por ter sido considerado doente mental. Ali, permaneceu durante dois meses conseguindo passar relativamente bem, fazendo amizade com alguns enfermeiros e conseguindo, inclusive, que fizessem vista grossa para alguns passeios pela cidade. Ao final de dois meses, sem justificativa plausível para sua permanência no hospital, João Cândido foi levado de volta ao presídio da Ilha das Cobras
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1913
Desde 1913, passou a representar o Brasil no Comitê Internacional da Liga Internacional contra a Epilepsia. Naquele período, foi realizado o Congresso Jubilar da Société de Médecine Mentale de Bruxelas/Bélgica, em que foi aclamado juntamente com Dupré e Lepine (franceses) e Mott (inglês) membros honorários daquela Sociedade.
22-25/10/1913 - Em Berlim/Alemanha, foi delegado do governo brasileiro na 11ª International Conference on Tuberculosis
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1917
Foi membro da Diretoria da Academia Brasileira de Ciências entre 1917 e 1929, ocupando o cargo de Presidente no último triênio.
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1918
No ano de 1918, foi membro organizador do Congresso Internacional de Medicina em Budapeste/Hungria para tratar da questão das doenças mentais e nervosas produzidas pela arteriosclerose. Participou da conferência Internacional para o estudo da Lepra na Noruega, recebendo do sábio leprólogo Hansen (que batiza o nome da doença no Brasil) a incumbência de tratar da questão das doenças mentais nos leprosos, sendo posteriormente publicados seus estudos no Zeitschrift fur Psychiatrie na Alemanha.
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1920
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1921 05 21 - O Paiz (RJ)
http://memoria.bn.gov.br/DocReader/178691_05/5700
1921
1921
Inauguração do Pavilhão "Juliano Moreira" na Colônia de Alienados de Vargem Alegre em Barra do Pirai-RJ
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1922
Eleito membro correspondente da Liga de Higiene Mental de Paris e do Comitê Internacional de Redação da folia neurológica, um importante órgão de Amsterdã para estudos de biologia do sistema nervoso. Presidiu os Congressos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Medicina Legal
Devido a sua conduta ética, moral, seu incansável trabalho e suas associações com as diversas áreas do conhecimento, foi eleito membro de diversas organizações tais como a Medico-Legal Society de Nova York; Sociedade de Neurologia de Buenos Aires; Sociedade de Psychiatria de Buenos Aires; Antropologische Gesellschaft de Munich; Société de Médicine de Paris; Société de Pathologie Exotique; Sociéte Clinique de France; Société Clinique de Medicine Mentale; Liga de Defesa Nacional; Liga de Higiene Mental; American Academic of Political and Social Science; Société MedicoPsychologique de Paris; Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; Academia de Letras da Bahia; Instituto Brasileiro de Ciências.
1922
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Um fato histórico pouco divulgado foi à visita de Albert Einstein ao Brasil . O fato é que o ilustre cientista esteve hospedado no Hotel Glória do Rio de Janeiro e no dia sete de maio falou para o mundo científico brasileiro na sede da Academia Brasileira de Ciências. Sua conferência foi apresentada em francês e o assunto era extremamente atual na época: Resultados obtidos na Alemanha nos Estudos sobre a Natureza da Luz, comparando a teoria ondulatória e a dos quantas. (Esta conferência foi publicada no Vol.1 número 1 pág.1:3 da Revista da Academia Brasileira de Ciências).
Einstein surpreendeu-se ao encontrar na presidência dos trabalhos um senhor de olhos grandes e penetrantes, pele escura, e franzino. Era Juliano Moreira, presidente da ABC e reconhecido pela inteligência brasileira não só como um grande médico, mas “como um sábio, no mais amplo e rigoroso significado dessa expressão.”
1925 01 28 - Universal (RJ)
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Juliano Moreira é condecorado pela Universidade de Hamburgo
Universidade de Hamburgo conferiu-lhe a Medalha de Ouro, que é a maior honra que lhe é dado conferir a um professor estrangeiro.
Fonte: Acervo da Prof.ª Maria de Fátima Vianna de Vasconcelos (RJ)
1928
Em julho de 1928, começou uma longa viagem visitando cidades do Oriente como Tóquio, Kioto, Sendai, Hokaído, Osaka e Funoko. Em solenidade no anfiteatro do Diário Nishi-Nishi, recebeu a insígnia da “Ordem do Tesouro Sagrado“ entregue pelo Imperador do Japão e destinada aos “consagrados da ciência mundial”. Isto devido também à sua intensiva luta contra o preconceito e a discriminação, que a este ponto da história, era também direcionada aos imigrantes sino-japoneses que desembarcavam no Brasil, sofrendo diversos tipos de preconceitos, sendo inclusive chamados de “ameaça amarela”. Depois, seguiu para a Europa, onde se tornou membro honorário da Sociedade de Neurologia e Psiquiatria de Berlim, da Sociedade Médica de Munique e da Cruz Vermelha Alemã. Em Hamburgo, é eleito membro da Sociedade de Neurologia e Psiquiatria, onde lhe é conferido, pela Universidade local, a Medalha de Ouro, a mais alta honraria prestada a professor estrangeiro.
Imigração Japonesa | Viagem de Juliano Moreira ao Japão
por Michele Eduarda Brasil de Sá 14 jun 2022
Artigo arquivado em Imigração Japonesa
Durante quase quatro meses, o ilustre médico brasileiro Juliano Moreira esteve em solo nipônico, visitando escolas, universidades, jornais e realizando conferências. O ano era 1928 e já grassavam no Brasil, como fora dele, as advertências dos que acreditavam no "perigo amarelo" — termo utilizado na época para designar a "ameaça dos povos orientais" (primeiramente os chineses, depois os japoneses). As advertências eram fundamentadas nas tendências imperialistas já demonstradas tanto pela China quanto pelo Japão, mas também no pensamento eugenista, segundo o qual a miscigenação se tornaria um grave problema para o Brasil a longo prazo. Neste ponto, inclusive, outros médicos de prestígio como Antônio Xavier de Oliveira e Miguel Couto, deputados durante a Assembleia Nacional Constituinte de 1933, já se posicionavam contra a imigração japonesa, tanto que a Constituição Federal de 1934 instituiu, em seu artigo 121, § 6o., o estabelecimento de cotas de imigração.
Desta viagem resultou o livro "Impressões de uma viagem ao Japão em 1928", publicado apenas em 1935, depois que Juliano Moreira já havia falecido. O organizador e editor do volume, o médico psiquiatra Waldemar de Almeida, teve o apoio da viúva, Sra. Augusta Peick Moreira, que tinha acompanhado o marido na viagem e até mesmo contribuiu com textos seus na segunda parte. Embora nas "Palavras Explicativas" no início do livro o Dr. Waldemar de Almeida pontue que se trata de um primeiro volume de uma planejada série de publicações com a obra científica de Moreira, em determinada altura do texto percebemos que a autoridade do nome do médico psiquiatra estava ali sendo reclamada a um verdadeiro discurso de defesa do povo japonês:
No capítulo "Convém ao Brasil a imigração japonesa?", Juliano Moreira apresenta brevemente o seu entendimento acerca da questão. Embora ele mesmo apoiasse práticas de cunho eugenista, como a esterilização dos "degenerados", Moreira não acolhia a tese segundo a qual o fator determinante para o empobrecimento biológico de um povo repousava sobre uma dada raça. Para ele, não parecia fazer diferença haver o cruzamento entre indivíduos de raças X e/ou Y, mas sim entre "bons elementos". Assim ele escreve:
"Caso se verifique este cruzamento as consequências serão boas e até excelentes, se se cruzaram bons elementos de um e outro grupo, por isso que os tipos resultantes dos cruzamentos estão quase sempre em relação às qualidades dos elementos que se cruzam.
Do estudo que há muito venho fazendo sobre cruzamentos em nosso país, veio-me a convicção de que não devemos tirar regras absolutas condenatórias de tais cruzamentos."
Em favor da imigração japonesa — e contrariando os argumentos que apontavam a assimilação dos japoneses como algo impossível — Moreira apresenta o esforço despendido no intercâmbio com outros países (a partir do próprio aprendizado da língua inglesa e de outras europeias) após a reabertura dos portos ao Ocidente. Ele se pronuncia favoravelmente à presença de imigrantes japoneses no Amazonas, como motores do desbravamento de que a região necessita, para abrir caminho para os demais e para melhor integrá-la ao país. Ele aponta ainda a existência de filhos de japoneses que não falam a língua de seus pais, sendo o português sua única língua.
Qual a força destes argumentos, e qual o alcance deste livro? Prosseguiram, nos anos seguintes, os embates entre os propagandistas do "perigo amarelo" e os simpatizantes da imigração japonesa, até que Brasil e Japão se viram definitivamente em lados opostos na guerra. Mesmo tendo ela terminado, em 1945, ainda havia quem levantasse a bandeira não apenas pela restrição, mas pela proibição da imigração japonesa no Brasil. O deputado Miguel Couto Filho, seguindo os passos do pai, assinou e submeteu em 1946, junto com o deputado José Augusto (UDN-RN), o projeto de emenda constitucional de número 3.165, propondo que fosse proibida "a entrada no país de imigrantes japoneses de qualquer idade e de qualquer procedência” (HAYASHI, 2022, p.4-5). A quem disser que este projeto era puro revanchismo passado de pai para filho, Dos Santos (2019, p. 381) responde que a votação ficou empatada (99 votos a favor e 99, contra), tendo sido necessário o voto de Minerva, contrário ao projeto, para impedir que a ideia se concretizasse — tamanho o acirramento dos ânimos ainda naquela época.
Referências bibliográficas:
HAYASHI, Bruno Naomassa. Metamorfoses do amarelo: a imigração japonesa do “perigo amarelo” à “democracia racial”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 37, 2022.
DOS SANTOS, R. L. “Livrai-nos do maléfico perigo amarelo”. Faces da História, v. 6, n. 1, p. 364-384, 21 jun. 2019.
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1929
Em 1929, já muito debilitado devido à tuberculose crônica, preside, no Rio de Janeiro, a Conferência Internacional de Psiquiatria.
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1930
Em novembro de 1930, o novo presidente, Getúlio Vargas, dissolveu o Congresso Nacional, as câmaras e as assembleias estaduais. Nomeou interventores nos Estados, mantendo seus compromissos com as oligarquias dissidentes. Em 8 de dezembro de 1930, Juliano Moreira foi destituído da direção do Hospital Nacional de Alienados, onde também morava. Aposentado, foi morar num hotel em Santa Teresa. Manteve suas visitas a alguns de seus pacientes particulares no Sanatório Botafogo, de Ulysses Vianna, e as sessões da Sociedade Brasileira de Neurologia, Psiquiatria e Medicina.
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1931
1931 - Posse da nova diretoria da Sociedade de Internos dos Hospitaes na qual Juliano Moreira compareceu.
1931 11 28 - Fon Fon : Semanario Alegre, Politico, Critico e Espusiante (RJ)
http://memoria.bn.gov.br/DocReader/259063/78296
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1932
Em 17 de novembro de 1932, retornou pela última vez à Sociedade que fundara, para uma sessão solene
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1933
A tuberculose avançava. Miguel Couto, seu médico, decidiu encaminhá-lo à Serra de Petrópolis. Hospedou-se na residência de Hermelindo Lopes Rodrigues, um de seus maiores discípulos. Faleceu no Sanatório de Correias, na cidade de Petrópolis, onde se internara para tratamento de tuberculose no dia 2 de maio de 1933, o baiano Juliano Moreira deixa escapar o último suspiro, mas, encantado, deixou para o mundo uma obra imorredoura.
Não deixou filhos.
1933 05 03 - Jornal do Brasil (RJ)
http://memoria.bn.gov.br/DocReader/030015_05/32575
1933 05 03 - Correio da Manhã (RJ)
http://memoria.bn.gov.br/DocReader/089842_04/16330
Dois aspectos do enterro de Juliano Moreira, tomados à saída do Hospital Nacional de Alienados, onde ficou por três dias exposto à visita publica, na capela do hospital e no cemitério de São João Batista, na ocasião em que falava o professor Henrique Roxo.
1933 05 13 - Fon Fon : Semanario Alegre, Politico, Critico e Espusiante (RJ)
http://memoria.bn.gov.br/DocReader/259063/83090
Lembrado porque “revolucionou o tratamento de pessoas com transtornos mentais no Brasil e lutou incansavelmente para combater o racismo científico e a falsa ligação de doença mental à cor da pele”
O primeiro doodle do Google em 2021 surpreendeu. O homenageado foi o psiquiatra, cientista e professor baiano Juliano Moreira (1872-1933), um dos primeiros médicos negros nascidos no País.
Para justificar a escolha, o Google lembrou que, no início do século 20, Moreira “revolucionou o tratamento de pessoas com transtornos mentais no Brasil e lutou incansavelmente para combater o racismo científico e a falsa ligação de doença mental à cor da pele”. Nesta quarta-feira (2021 01 06), seu nascimento completa 149 anos.
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Leituras recomendadas JACOBINA, Ronaldo Ribeiro. Da dermatologia à psiquiatria: vida e obra de Juliano Moreira na Bahia. In: PONDÉ, Milena Pereira; LIMA, Manoela Garcia; ASSIS-FILHO, Bernardo. A Tensão na Atenção. Anais da XII Jornada Nordestina de Psiquiatria.Salvador: Associação Psiquiátrica da Bahia, 2008. JACOBINA, Ronaldo Ribeiro; GELMAN, Ester. Juliano Moreira e a Gazeta Médica da Bahia. História, Ciência e Saúde - Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 15, n. 4, p. 1077- 1097, out.-dez. 2008. MEMORIAL Professor Juliano Moreira. Juliano Moreira: O mestre / A instituição. Salvador: Empresa Gráfica do Estado da Bahia; Secretaria de Saúde do Estado da Bahia, 2007. ODA, Ana Maria Galdini Raimundo; DALGALARRONDO, Paulo. Juliano Moreira: um psiquiatra negro frente ao racismo científico. Revista Brasileira de Psiquiatria, Campinas, v. 22, n. 4, p. 178-9, 2000. PASSOS, Alexandre. Juliano Moreira (vida e obra). Rio de Janeiro: Livraria São José, 1975. PEIXOTO, Afrânio. Um sábio mestre e amigo. Arquivos Brasileiros de Medicina, v. 23, p. 179-196, 1933. VENANCIO, Ana Teresa A. As faces de Juliano Moreira: luzes e sombras sobre seu acervo pessoal e suas publicações. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, n. 36, 2005.
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